NOVO CAPÍTULO NA SEGUNDA RETOMADA DA ALDEIA CINTA VERMELHA JUNDIABA EM ARAÇUAÍ
- Katia Torres
- há 3 dias
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A Aldeia Cinta Vermelha Jundiba, em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha (MG), vive um momento em que a segunda retomada de seu território tradicional ganha um novo e decisivo capítulo. Com a participação ativa do deputado federal Leonardo Monteiro (PT) e uma postura da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que a própria aldeia considera uma reparação histórica, a mobilização da comunidade, iniciada no mês passado, é impulsionada pela urgência de proteger suas terras contra a crescente mineração de lítio e pela necessidade de resolver o acesso à água.
Toakaninã Pankararu, uma das vozes da aldeia, descreve essa nova fase com otimismo cauteloso. Para ela, a Funai demonstra um reconhecimento de falhas passadas, o que se traduz em agilidade do órgão que agendou uma "(...) vinda aqui no território neste início de outubro com uma agenda construída juntamente com a gente." Essa mudança é recebida com alívio: "A gente se sentiu assim, por parte da Funai, a gente se sentiu considerado..."
A atuação do deputado federal Leonardo Monteiro (PT) é central nesse processo renovado. Toakaninã explica que ele não só impulsionou a emenda para a ampliação do território há mais de uma década, mas agora "se comprometeu também a fazer essa retomada junto com a gente..." Foi Monteiro quem, segundo a liderança, "entrou em contato com a Funai diretamente", catalisando a resposta atual do órgão.
Ação da Funai
Em reunião em Brasília, a presidenta da Funai, Joenia Wapichana, e sua equipe técnica discutiram com Monteiro ações conjuntas para assegurar os direitos da aldeia em Araçuaí.
A fundação ainda destacou que o objetivo é resolver, entre outras questões, a dificuldade de acesso à água no território, um problema que, embora específico, está intrinsecamente ligado aos impactos mais amplos das atividades externas, como a mineração. Wapichana ainda aproveitou o encontro para pedir o apoio do deputado no Congresso Nacional para frear o avanço de propostas legislativas prejudiciais aos povos indígenas.
A expectativa é que a agenda, marcada para outubro deste ano, com a vinda de técnicos da Funai para "precificar e negociar com o proprietário do território nosso", seja um marco decisivo para a comunidade indígena. Toakaninã revela a preparação da aldeia: "Nós temos GT pronto há décadas (...) desde 2012, nós temos relatório pronto dessa área da reserva da Aldeia Cinta Vermelha Jundiba." Essa agenda, construída coletivamente, é vista como um passo vital para a resolução definitiva.
Desafios e apelo por celeridade
Apesar dos avanços recentes no diálogo com a Funai e o apoio do deputado, a retomada não ocorre sem tensões. Toakaninã Pankararu expressa a preocupação com reações racistas região: "É importante que esse problema seja resolvido o mais rápido possível pela Funai, né? E pelos órgãos competentes, porque devido a nessa nossa ação e o apoio do deputado, nós já estamos recebendo aqui muitas críticas, sabe?"
A situação é agravada pela proliferação de discursos de ódio, com a liderança alertando que a comunidade, que já sofre "discriminação e racismo", tem recebido "muitas palavras de cunho racista, discriminatório (...) através da internet." Diante disso, a representante indígena faz um apelo pela celeridade na resolução, pois "conforme vai demorando, as coisas vão se acirrando mais." A comunidade aguarda com esperança, mas também com a urgência de quem sabe que a demora pode intensificar os conflitos.
Uma luta de mais de uma década
Uma carta de apoio do Grupo de Extensão e Pesquisa em Agricultura Familiar (GEPAF) da UFVJM, de junho de 2012, revela a persistência dessa luta. Em 2011, por proposição do Deputado Leonardo Monteiro, foi apresentada e aprovada uma emenda parlamentar no valor de R$ 1,7 milhão no orçamento da União para a FUNAI ampliar e demarcar o território da aldeia.
No entanto, conforme o GEPAF e os relatos da comunidade, os recursos não foram disponibilizados e operacionalizados pela FUNAI. A justificativa foi a incapacidade administrativa da Fundação para cumprir os requisitos burocráticos para executar a despesa dentro dos prazos do ciclo orçamentário. Para que o dinheiro fosse efetivamente usado na compra da fazenda, a Funai precisaria ter “empenhado” o valor, ou seja, reservado formalmente a quantia para o fim específico.
A ausência de laudos técnicos, pareceres e negociações a tempo impediu esse empenho. Ao final do ano fiscal, o dinheiro não empenhado simplesmente “caducou”, retornando ao caixa geral do Tesouro.
Em 13 de setembro de 2023, uma comitiva formada por Cleonice Pankararu, Uakirê Pankararu-Pataxó e representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) foi recebida em Brasília pela presidenta da Funai, Joenia Wapichana, e pela diretora de Proteção Territorial (DPT), Janete de Carvalho.
Na reunião, duas demandas centrais foram apresentadas: a proposta de transferência de terras dominiais indígenas, incluindo a Fazenda Cristal, para a União, visando a ampliação da Reserva Indígena Cinta Vermelha Jundiba, e o pedido de intervenção da Funai no licenciamento ambiental de um empreendimento minerário de lítio na região, que já impactava negativamente a vida da comunidade, com prejuízos no abastecimento de água e restrição de locais de pesca.
Foi esta sequência de acontecimentos que sucedeu a esta segunda retomada dos povos Pankararu e Pataxós.
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